Páginas

terça-feira, 27 de maio de 2014

Um bicho chamado eczema

Era muito pequena quando a minha mãe me levou ao médico, porque as comichões não eram normais. Nem as comichões, nem a vermelhidão na pele e as feridas que o coçar constante e repetido criavam!
“Sarna”, disse a médica. E desinfectavam-se lençóis mais do que uma vez ao dia, só se usava determinadas roupas e até me separavam do meu irmão. Há profissionais que não deviam existir ou então ser punidos. Ainda para mais na saúde! Pior que tudo, eram os produtos medicinais. Era muito pequena quando a minha mãe me levou ao médico, mas parece que ainda recordo o quanto me ardia quando me lavavam com aquele líquido que se me entranhava nas feridas e me secava ainda mais. Atiçava o bicho!
Não durou muito! Era muito pequena quando a minha mãe decidiu levar-me a um dermatologista. A vários, depois. Poucos conseguiam ajudar ou se ajudavam era apenas por pouco tempo. Quase ninguém sabia o que era ou sabiam pouco.
Fui aprendendo a lidar com o bicho chamado eczema. Bem, há bichos piores. Doenças que se não nos levam a vida, levam-nos a alma. Mas também não é pêra doce lidar com este bicho.
Ele está lá e ninguém sabe que ele lá está até verem as zonas críticas: as dobras dos braços, das pernas e, muitas vezes, os tornozelos. Chegou a aparecer na cara, mas felizmente não gostou do poiso.
São as comichões que atormentam, pior nos dias de maior stress. “Tem tudo a ver com o sistema nervoso”, insistem como se fosse decisão minha acalmar-me ou enervar-me quando quero, posso e mando. E depois das comichões, as feridas, os arranhões. “Tens a cara às manchas, deve ser da base”, dizem-me. Não, não é da base. É deste bicho que vive comigo desde que era muito pequena e a minha mãe me levou ao médico. “Tens um gato? Estás cheia de arranhões.” Não tenho gatos, odeio gatos, mas odeio ainda mais o bicho, o tal que temos vindo a falar.
Odeio-o, mas já aprendi a viver com ele e nunca sofri o demasiado. Sempre me rodeei de pessoas maiores que lidaram com o bicho tão bem ou melhor do que eu. Nunca me privei de andar de saia, de tops, de ir à praia e de mostrar a minha pele. Porque também nunca me senti privada. Senti-me, antes, acompanhada!
O bicho podia ter desaparecido ao chegar à idade crítica, aquela em que discutimos com as mães porque sim e porque não e achamos que dia sim, dia não o mundo cai sobre as nossas cabeças. Desaparece em mais de 90% dos casos. O meu caso foi excepção. Tanta coisa para ser distinta e tinha de o ser nisto.

Não digo que seja uma provação, mas acredito que as pessoas que têm de lidar com o bicho do eczema são pessoas melhores. Eu sou-o! E sei que também é por causa deste bicho chamado eczema.

L. 

Sem comentários:

Enviar um comentário