Era muito pequena quando a minha mãe me levou ao médico,
porque as comichões não eram normais. Nem as comichões, nem a vermelhidão na
pele e as feridas que o coçar constante e repetido criavam!
“Sarna”, disse a médica. E desinfectavam-se lençóis mais do
que uma vez ao dia, só se usava determinadas roupas e até me separavam do meu
irmão. Há profissionais que não deviam existir ou então ser punidos. Ainda para
mais na saúde! Pior que tudo, eram os produtos medicinais. Era muito pequena
quando a minha mãe me levou ao médico, mas parece que ainda recordo o quanto me
ardia quando me lavavam com aquele líquido que se me entranhava nas feridas e
me secava ainda mais. Atiçava o bicho!
Não durou muito! Era muito pequena quando a minha mãe decidiu
levar-me a um dermatologista. A vários, depois. Poucos conseguiam ajudar ou se
ajudavam era apenas por pouco tempo. Quase ninguém sabia o que era ou sabiam
pouco.
Fui aprendendo a lidar com o bicho chamado eczema. Bem, há
bichos piores. Doenças que se não nos levam a vida, levam-nos a alma. Mas
também não é pêra doce lidar com este bicho.
Ele está lá e ninguém sabe que ele lá está até verem as
zonas críticas: as dobras dos braços, das pernas e, muitas vezes, os
tornozelos. Chegou a aparecer na cara, mas felizmente não gostou do poiso.
São as comichões que atormentam, pior nos dias de maior
stress. “Tem tudo a ver com o sistema nervoso”, insistem como se fosse decisão
minha acalmar-me ou enervar-me quando quero, posso e mando. E depois das
comichões, as feridas, os arranhões. “Tens a cara às manchas, deve ser da
base”, dizem-me. Não, não é da base. É deste bicho que vive comigo desde que
era muito pequena e a minha mãe me levou ao médico. “Tens um gato? Estás cheia
de arranhões.” Não tenho gatos, odeio gatos, mas odeio ainda mais o bicho, o
tal que temos vindo a falar.
Odeio-o, mas já aprendi a viver com ele e nunca sofri o
demasiado. Sempre me rodeei de pessoas maiores que lidaram com o bicho tão bem
ou melhor do que eu. Nunca me privei de andar de saia, de tops, de ir à praia e
de mostrar a minha pele. Porque também nunca me senti privada. Senti-me, antes,
acompanhada!
O bicho podia ter desaparecido ao chegar à idade crítica,
aquela em que discutimos com as mães porque sim e porque não e achamos que dia
sim, dia não o mundo cai sobre as nossas cabeças. Desaparece em mais de 90% dos
casos. O meu caso foi excepção. Tanta coisa para ser distinta e tinha de o ser
nisto.
Não digo que seja uma provação, mas acredito que as pessoas
que têm de lidar com o bicho do eczema são pessoas melhores. Eu sou-o! E sei
que também é por causa deste bicho chamado eczema.
L.
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